Existe algo de mágico quando alguém empresta olhos frescos a um problema. Um olhar alimentado pela curiosidade e livre de conceitos prévios tem o poder de produzir insights e questionamentos que podem ser invisíveis a quem vive imerso naquela área. Essa era a convicção do engenheiro do Google Luiz André Barroso, cujo obituário escrevemos recentemente para a Revista Pesquisa Fapesp. Luiz André aplicou essa ideia de forma radical à sua própria carreira em tecnologia, sempre buscando posições e desafios diferentes, mas o conceito também é perfeito para o jornalismo.
Na semana passada refletimos aqui, nos textos da Figa, sobre a necessidade de uma cobertura jornalística mais multidisciplinar, que quebre as caixinhas das editorias – em especial em questões tão urgentes como o aquecimento global, como fez também aliás o ombudsman da Folha, pedindo a transversalidade para essa que se tornou a cobertura mais importante de todas. O conceito dos “olhos virgens” conversa com essa necessidade. Quando resolvem mergulhar em um assunto no qual não são especialistas, profissionais experientes e sagazes são capazes de oferecer análises originais, claridade de raciocínio e sínteses potentes.
Debruçar-se sobre algo sem preconceitos é uma celebração do jornalismo, é a essência do que o jornalista deve fazer no seu dia a dia. É claro que existe uma tendência de especialização, e ser especializado numa área tem seus benefícios: conhecimento aprofundado, fontes, agilidade na apuração. Mas explorar caminhos fora da área que se frequenta mais – como vem acontecendo conosco da Figa em coberturas de educação, tecnologia, mercado do luxo e mundo corporativo – é muito enriquecedor, não só para nós como profissionais, mas também para o enfoque do resultado final.
A mágica só acontece, no entanto, se se adotar uma posição de ir fundo no assunto para aprender o máximo possível, com muitas perguntas e pesquisa. Aprender para divulgar de forma mais clara e compreensível para o maior número possível de pessoas depois é também uma função básica do jornalismo. É um excelente exercício para quem está há muito tempo cobrindo a mesma área. E, fora do ambiente jornalístico, é uma ótima prática, que muitas empresas adotam na cultura de rotação e intercâmbio de cargos e posições.